quarta-feira, 6 de outubro de 2021

BILLIARDS: A CASA DE JOGO VARZEENSE À MODA ANTIGA

 



 

Por Epitácio Germano


O trecho da Rua Afonso Cândido, mais precisamente localizado ao longo da Praça Joaquim Marinho, e com extensão predial de esquina à casa amarela de arquitetura antiga e com pentágonos de cor vermelha, pertencente a João Balbina , concentrou a partir do início dos anos de 1950 o principal e mais tradicional billiards varzeense.

O prédio com estrutura quadrada, paredes brancas pintadas com cal e três portas de entrada de madeira tinha um espaço reservado com uma mesa de sinuca e, outro, dividido em sua estrutura com uma mesa para jogo baralho e, mais ao fundo, uma murada e um banheiro reservado aos frequentadores. Em alguns momentos também se registraram grandes partidas de bozó, prática secular que envolve o jogo de dados.

O ambiente de desenho simples era atrativo aos jogadores, que costumavam chegar e aproveitar o expediente de lazer para também degustar de uma lapada de cachaça como aperitivo, antes do início das disputas. O surgimento do billiards quebrava naquele período da história, o segmento econômico local do comércio formado apenas pelas tradicionais bodegas. E, assim, como qualquer outro espaço de jogo popular, a sinuca como ficou batizada, era também frequentada pelos curiosos que se mantinham reservados ao receio conservador de evitar o jogo pelo vício, no entanto, mantendo-se sempre ativos a cada detalhe das partidas, e até mesmo, arriscando palpites e causando estresse para quem estava na mesa de jogo e tentava se concentrar na criação de estratégias.

O prédio onde se consolidou a tradicional sinuca, no coração da cidade, se mantém até os dias atuais, porém não foi neste espaço onde toda essa história que envolve a atração pelo jogo com a utilização de bolas e tacos começou. A origem do billiards nasceu na Rua Manoel Dantas e bem antes dos anos 50, quando Dario lançou na cidade o primeiro espaço com uma mesa de sinuca comercial. De estrutura mais antiga, o local funcionava em um prédio projetado como residência, mas que ao longo do tempo, além do billiards se caracterizou como prédio de negócios, abrigando com o passar dos anos o funcionamento de bar, loja de artigos, e logo após o início dos anos 2000 se fixando pela marca do Mercardinho São Jorge, que segue ativo no comércio local até os dias atuais.

  

Bola quatro e uma mordida de raiva

 

No billiards do centro da cidade, uma das partidas que ficou marcada na lembrança dos assíduos jogadores foi protagonizada por Zé Tobias, cidadão potiguar da cidade de Ouro Branco, que costumava visitar o local como alternativa de lazer. Irritado por não conseguir encaçapar a bola de número quatro e vencer o jogo para encerrar a partida, Zé Tobias arremessou com força o taco sobre a mesa e agarrou com suas mãos a bola devolvendo com uma mordida toda a sua euforia, o fato de a mesma não correr ao destino que garantiria sua vitória. Daí em diante, quem ficava no jogo pela bola número quatro, sofria por ser enquadrado na sina Zé  Tobias. O dilema então era: se o jogo terminaria com a bola número quatro sendo símbolo de consagração de uma vitória ou mordida.

 

A patota que fez o mudo falar

 

O jogo de baralho também era parte ambiente da sinuca dividindo o mesmo espaço, e uma das partidas mais cômicas registradas, aconteceu em uma rodada com João Balbina, Cazuza, Zé Grandão e um indivíduo que se apresentou como mudo, e em silêncio, tentou derrotar na mesa àqueles que além da experiência, eram comuns ao ambiente. O mudo jogou três dias seguidos e não conseguiu emplacar um bom desempenho frente aos concorrentes. Indignado, expressava inquietude em alguns movimentos sobre a mesa, e no terceiro e último dia, perdeu a paciência, levantou-se e reclamou falando que não aguentava mais perder. A história com isso tornou-se uma patota, sendo a sinuca o único lugar da cidade que fez alguém mudo falar.

Fora das mesas, a sinuca também deixou bordões populares que vem desde o tempo de ouro, época de grande exploração da Mina da Quixaba, até o momento da emancipação e independência política do antigo Distrito de Sabugirana, como sendo: o lugar onde a notícia chega primeiro, ou onde o assunto de política termina em jogo e apostas. O espaço que todo adolescente nascido e criado em Várzea sonhava de entrar ao completar a maior idade, apenas pelo simples fato de matar a curiosidade, e entender o porquê de tantas pessoas se concentrarem ali.


Eternas memórias da política local



 Por pertencer a João Balbina, personagem tradicional da política local, o prédio da sinuca também foi palco de festanças políticas, com direito a banquete para  os eleitores e danças.  Ao vencer pela primeira vez a disputa para o cargo de chefe do poder executivo nas eleições de 1965, João Balbina suspendeu os jogos de sinuca e baralho e transformou o espaço em um salão de danças para festejar a vitória junto aos seus correligionários e eleitores.

Nesse mesmo ano, ainda durante o período eleitoral, a sinuca se transformou por vários momentos em pontos  de concentração dos eleitores do partido da antiga Arena - que costumavam aproveitar os grandes caldeirões com carnes, farofa, feijão e arroz que eram ofertados. Quem detinha de afinidade a João Balbina não perdia uma concentração, enquanto que do outro lado da esquina, poucos metros a extensão do Coreto Municipal, Mario Primo de Araújo, político oposto a Arena também protagonizou aos seus eleitores uma recepção de banquetes na antiga casa da Quixaba.

     
    De geração para geração, a sinuca que chegou à cidade pelo espírito cortês de Dario, não se resume apenas a um retrato jogado pelo tempo dentro do imaginário coletivo. Além disso, a sinuca segue viva e sendo administrada por Chico Velho e Dedé de Dario, ambos filhos do saudoso Dario - assim como tantos outros que também são lembrados pela colaboração para o funcionamento do espaço como Pinhão,  Marlito Amaral e Babá Batista.
        Entre os tantos relatos que são narrados ao longo de mais de meio século de jogos, a sinuca ainda desperta em seus esfalfados espaços de antigas paredes de tijolos maciços e piso de cimento queimado, memórias de momentos diferentes e fatos protagonizados também por pessoas dos mais diversos lugares, mas que têm em comum, além do desejo do jogo, o protagonismo de se misturar à própria história local.

3 comentários:

  1. Quem não se lembra do finado Netinho Santiago , que quando Perdia uma partida praticamente ganha , ele passava o taco por debaixo da mesa. Kkkkkk

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  2. Quem não se lembra das lendárias tirinhas.

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  3. Uma certa noite eu fui jogar com o finado Zé careca e assistido por papai ( Chico papi ) im memória. Eu dava duas bolas pra ele e acabou o jogo ele me devendo 65 reais. Dois grandes homens falados aqui.

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