Por Rafael Medeiros
Os
nascidos entre as décadas de 80 e 90
certamente vivenciaram momentos inesquecíveis que marcaram a história do mundo
recente, como por exemplo, a queda do muro de Berlim em 1989, a transição de
séculos/milênios entre 2000 e 2001, o ataque terrorista às torres gêmeas do World
Trade Center em Nova Iorque, a seleção brasileira de futebol se consagrar
campeã mundial em duas copas e, não menos importante, a passagem de bastão da
era analógica para a era digital, o que alterou significativamente os hábitos e
costumes de todos os inseridos nesse contexto.
Nesse período, a popularização da internet
representava o marco principal da evolução tecnológica mundial. A rede mundial de computadores, surgida inicialmente como uma estratégia militar dos Estados Unidos para descentralizar os dados estratégicos das bases
militares, havia tido uma grande explosão no Brasil exatamente no início dos anos 2000, porque o acesso a computadores
pessoais se difundira bastante em todo o país, por mais que o acesso à internet acontecesse ainda na conexão discada.
Uma cidade online
A Várzea do início dos anos 2000 era pacata,
pintada com as singelas cores de toda cidade do interior e ainda conservava os
saudáveis hábitos de socialização mais antigos, como, por exemplo, o de
frequentar a praça à boca da noite para, de boca em boca, colocar as conversas
e fofocas em dia. Era uma forma honesta e simples de cultivar os apegos e as relações
nas redes sociais da vida real.
Foi então que em junho de 2006, às vésperas do João
Pedro daquele ano, o microempresário Edinildo Araújo abriu o primeiro estabelecimento
da cidade com acesso à internet via rádio. O ambiente contava com algumas poucas máquinas
conectadas e uma internet lentinha, mas que já se configurava como um avanço
tecnológico gigante sobretudo para a juventude da época, que disputava os
horários e as cadeiras do local para se conectarem com o resto do mundo. Pouco tempo
depois o também microempresário Wandick Wagner decidiu transformar o seu espaço
de gameroom e videolocadora que tanto sucesso fizera no final dos anos 90 em um
espaço de lan house, abrindo, assim, uma saudável concorrência no serviço local
de conexão via web e dando mais opções de acesso a uma massa cada vez mais
aficionada pelas seduções do mundo digital.
O jornalista Rodolfo André na lan house de Edinho em registro de 2006 |
Era como se os bancos da praça disputassem com as
cadeiras das lan houses os espaços para abancar as conversas do dia, mesmo que
por muitas vezes as conversas face a face apenas complementassem as interações
virtuais do MSN, que era o principal serviço de mensagens instantâneas da
época. Assim, no ritmo agitado com que os bares de Brizola e Demar disputavamquem tocava o dvd de forró mais estourado do momento, as ruas que contornavam a
praça formigavam de jovens e adolescentes que iam e voltavam das lan houses
cheios de novidades para compartilharem.
Enquanto isso, pelos lados calmos da rua Izabel
Leopoldina, em um espaço modesto que se localizava em frente ao orelhão do
hospital municipal, um empresário santa-luziense de nome Petrônio, em negociação
com o varzeense Jozenaldo Medeiros, abria um novo empreendimento no ramo das
lan houses para atender melhor à demanda cada vez maior de varzeenses conectados
e expandir a concorrência local para, assim, fazer frente ao monopólio dos
amigos Edinho e Wandick no setor dos serviços digitais. Assim, aquele cantinho
da Izabel Leopoldina tornou-se rapidamente mais um point de encontro na cidade,
aquecido pelo bom humor e atendimento diferenciado dos jovens varzeenses Carmita
Marinho e Jubson Dantas, que foram contratados para administrar o espaço. Cerca
de um ou dois anos após a inauguração, o próprio Jozenaldo Medeiros comprou
definitivamente a empresa e passou a administrá-la junto com sua esposa Eliete Medeiros.
A lan house de Jozenaldo era muitas vezes chamada pelos seus frequentadores
mais assíduos em tom de brincadeira de lan house de Jubson ou lan
house de Carmitinha, tamanha era a identificação dos funcionários para com
o local.
O mundo
na palma da mão
Por um bom tempo, até meados da década de 2010,
eram as lan houses que conectavam o varzeense com o universo à sua volta,
estreitando as fronteiras do mundo, bem como se perfazendo como uma janela
importante de conhecimento, comunicação e entretenimento. As lan houses não faziam par
No entanto, com a economia aquecida e o poder de compra mais acessível a partir da segunda metade da década de 2000, a população varzeense passou cada vez mais a adquirir seus próprios computadores e contratar serviços individuais de rede, o que fez com que o fluxo de clientes nas lan houses passasse gradativamente a diminuir.
Além disso, com o advento dos smartphones, as lan
houses enfim perderam força em sua principal função: o acesso às redes sociais.
Afinal, os aplicativos presentes nos smarts já eram um computador particular na
palma da mão de cada um e com isso, não havia mais necessidade de frequentar os
agora antigos espaços de socialização virtual, a não ser para serviços
específicos como impressão ou coisas do gênero.
Porém, não há varzeense que não se recorde com certas doses de saudade de como era divertido pagar uma horinha em uma daquelas lan houses para fazer uma pesquisa na internet, ler as postagens e os recados que chegavam nas redes sociais, interagir em aplicativos de mensagens como MSN e skype ou mesmo encontrar os amigos que se deslocavam até elas para se comunicarem com o resto do mundo pela janela da rede mundial de computadores.
Carmita Marinho*
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